sábado, 26 de janeiro de 2013

eu, (d)ela e você, e Vinícius.

porque eu sinto inveja dela opinar sobre os contornos da sua barba e você concordar com tamanho mau gosto.
porque eu sinto inveja dela ter livre acesso aos seus lábios e você marcar o pescoço dela com leves mordiscadas.
porque eu sinto inveja dela repousar a mão sob o seu joelho e você pensar que ela gosta da rótula protuberante após a queda da bicicleta aos 5 de idade.
porque eu sinto inveja dela sair com você para comprarem Always noturno e sorvete de chocolate na tpm.
porque eu sinto inveja dela dividir o mesmo guarda-chuva com você na saída do teatro.
porque eu sinto inveja dela ligar no seu celular e você atender no segundo toque porque antes sorriu para o descanso de tela.
porque eu sinto inveja dela dizer ao Nutricionista que você é o responsável pelo desaparecimento das latas de leite condensado debaixo da pia.
porque eu sinto inveja dela aparecer ao seu lado nas fotos da família e nelas você sorrir dizendo xis mesmo sendo avesso a fotografias (ou seria a sorrisos?).
porque eu sinto inveja dela recolher as roupas espalhadas pelo chão do quarto e você desculpar-se, jurando - em falso - não mais acontecer.
porque eu sinto inveja dela sentar no seu colo e você abandonar o trabalho pela metade, sem culpa.
porque eu sinto inveja dela ouvir você desafinar no refrão daquele velho rock inglês.
porque eu sinto inveja dela esconder as chaves somente para você recompensá-la com o seu melhor abraço.
porque eu sinto inveja dela pedir no disk-pizza o seu sabor preferido e coroar você como o Rei da casa.
porque eu sinto inveja dela sair de braços dados com você pela quadra e você apresentar a sua mulher para a moradora do segundo andar.
porque eu sinto inveja dela desligar a tv antes do Jornal da Globo começar e ouvir você criticar o jornalismo malicioso do William Waack.
porque eu sinto inveja dela rir seu riso, derramar seu pranto e você fazer as juras do Poetinha naquele Soneto.
porque eu sinto inveja dela mesmo sem a certeza que você já a tem na sua vida.
porque, parafraseando Vinícius, eu ainda preciso me dizer do amor (que tive), perdida nessa solidão que é o fim de quem ama.

L.C.
[parafraseado o "Soneto de Fidelidade", de Vinícius de Morais]

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